18 de novembro de 2022

Proposta de Diretiva ATAD 3: Entidades fictícias (shell entities)

Autor: João Pina

 

Em dezembro de 2021 a Comissão Europeia divulgou uma nova Proposta de Diretiva, que tem como desígnio fundamental impedir a criação de empresas de fachada ou shell corporations e a utilização abusiva dos benefícios fiscais comunitários por essas mesmas entidades.  

Esta nova Proposta de Diretiva vem no seguimento das já célebres e prestigiadas Anti Tax Avoidance Directives (“ATAD”) que têm vindo a ser recentemente acolhidas no seio da União Europeia.

A ATAD 1 consagrava cinco normas anti abuso (uma geral e quatro específicas) que os Estados-Membros adotaram a partir do dia 1 de janeiro de 2019:

  1. Limitação à dedução de gastos de financiamento;
  2. Tributação à saída (Exit tax);
  3. Regra geral anti abuso;
  4. Regra das sociedades estrangeiras controladas (Controlled Foreign Company ou “CFC”);
  5. Assimetrias híbridas (hybrid mismatchesarrangements).

A ATAD 2, produziu efeitos a partir de 1 de janeiro de 2020 (embora a regra das assimetrias híbridas inversas apenas seja aplicável desde o início de 2022) e funcionou como um complemento densificador das regras de assimetrias híbridas anteriormente introduzidas pela primeira ATAD.

A ATAD 3 tem agora o propósito de fortalecer o combate contra a evasão e elisão fiscal, estabelecendo critérios objetivos para que os Estados-Membros consigam identificar entidades residentes na UE que, independentemente da sua forma jurídica, não detenham qualquer substância económica, para que, consequentemente, consigam impedir o acesso de tais entidades a benefícios fiscais concedidos ao abrigo da legislação comunitária.

A avaliação do nível de substância económica de uma entidade passará, desde logo, pela verificação prévia de três critérios (conhecidos comogateways) que permitam aferir a existência de um risco acrescido de abuso ou elisão fiscal.

Os três critérios, de aplicação cumulativa, são os seguintes:

  1. Entidades cujas receitas dos dois exercícios anteriores correspondam a mais de 75% de rendimentos passivos;
  2. Entidades que exerçam maioritariamente atividades transfronteiriças;
  3. Entidades sem recursos próprios para o desenvolvimento da sua atividade, e que, nos dois exercícios anteriores, tenham recorrido à subcontratação de funções de gestão e administração.

Caso estes requisitos estejam preenchidos, a entidade em causa ficará obrigada a reportar na sua declaração anual de rendimentos, um conjunto de elementos (denominados de indicadores de substância mínima) relacionados, designadamente, com a existência de instalações fixas próprias, de conta bancária própria dentro da UE, e com a residência fiscal dos seus trabalhadores e administradores.

Se estes indicadores de substância mínima não estiverem preenchidos, presume-se que a entidade carece de substância económica, ficando assim adstrita às repercussões previstas na Proposta de Diretiva.

Esta presunção ilidível, poderá ser ultrapassada caso a entidade comprove que a sua atividade é efetivamente controlada no Estado-Membro da sua constituição e que os riscos inerentes dessa atividade são por esta suportados.

As empresas que não cumpram simultaneamente com os indicadores mínimos de substância e que não consigam comprovar a racionalidade económica da sua atividade, ficarão sujeitas às seguintes consequências:

  1. Inaplicabilidade das Convenções para Evitar a Dupla Tributação celebradas com o Estado-Membro da residência;
  2. Inaplicabilidade das Diretivas “Mães-Filhas”e “Juros e Royalties”;
  3. Impossibilidade de obtenção de um certificado de residência fiscal para apresentação noutras jurisdições (ou obtenção de certificado de residência onde esteja expressamente indicada a inaplicabilidade das Convenções e Diretivas);
  4. Determinados rendimentos gerados pela entidade sem substância económica serão imputados e tributados na esfera dos sócios, desde que os mesmos sejam residentes fiscais num Estado-Membro da União Europeia.

Caso seja adotada sem alterações ou reservas, a Diretiva deverá ser transposta pelos Estados-Membros até 30 de junho de 2023, para que a sua entrada em vigor ocorra a partir do dia 1 janeiro de 2024.

Não obstante, e atendendo ao facto de que, qualquer medida fiscal, tomada no seio da União Europeia, deve ser unanimemente aprovada pelos 27 Estados-Membros, algumas das disposições e definições consagradas no Projeto de Diretiva, podem ainda vir a ser objeto de remodelação.

Uma das mais prováveis alterações prende-se com a aplicação retroativa do período de dois anos para as avaliações dos gateways supramencionados.

Esta remissão para o passado, poderá conflituar diretamente com alguns dos princípios nucleares dos sistemas fiscais europeus, como o princípio da proibição da retroatividade fiscal, o princípio da segurança e certeza jurídica e o princípio da proteção da confiança e das legítimas expetativas dos contribuintes, dado que, e assumindo uma data de início de vigência a 1 de janeiro de 2024, o ano de 2022 está já incluído no escopo de incidência temporal da Diretiva.  

Por conseguinte, a sua entrada em vigor poderá ainda ser adiada para o dia 1 de janeiro de 2025.

 

 

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José Freitas

Tax Partner

jose.freitas@bakertilly.pt

 

 

 

 

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